Como evitar que a depressão desgaste o relacionamento a dois

Por Joel Rennó

Picos de agressividade, bruscas alterações de humor, desinteresse sexual, desânimo para atividades de lazer, apatia diante de tarefas domésticas, desleixo e baixa autoestima. Todos essas situações, comuns no dia a dia dos pacientes com depressão, podem interferir diretamente na vida conjugal, desgastando a relação. Mas o apoio do parceiro é, justamente, um dos pilares fundamentais para a adesão do paciente ao tratamento.

Só no ano passado, mais de 11 milhões de pessoas foram diagnosticadas com depressão no Brasil, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E, embora a doença afete grande parte da população, ainda hoje está envolta em desconhecimento e preconceito, dificultando a discussão sobre o tema e, consequentemente, a busca por ajuda. Por isso, é papel do parceiro encorajar seu companheiro a falar abertamente sobre o assunto, fortalecendo os laços de confiança entre eles.

Trata-se de uma doença que traz um estigma para os pacientes, que muitas vezes não são compreendidos nem mesmo pela família. Somente com informação de qualidade é que os familiares poderão entender que se trata de uma doença reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que apresenta vários aspectos biológicos e não tem nada a ver com preguiça, falta de força de vontade ou fé.

Como ajudar?
Uma vez identificado o problema, o cônjuge poderá exercer um papel fundamental para o sucesso do tratamento, atuando como um forte elo entre o médico e o paciente. Sem dúvida, a luta contra a desistência do tratamento é muito mais leve quando o companheiro do paciente trabalha em conjunto com o médico, especialmente nos casos graves de depressão. O cônjuge pode, por exemplo, responsabilizar-se pela medicação, caso prescrita pelo médico, lembrando ao paciente sobre os horários das tomadas. Ou, ainda, poderá assumir temporariamente algumas das tarefas domésticas do companheiro, como ir ao supermercado, entendendo que fadiga excessiva e apatia também podem ser sintomas da doença. É possível, em outra frente, oferecer companhia para as sessões de psicoterapia, caso o cônjuge concorde, bem como estimular que ele se alimente bem, exercite-se e estabeleça um bom padrão de sono.

A irritabilidade, outro sintoma comumente associado aos quadros depressivos, é mais um componente que pode interferir diretamente na vida conjugal, alimentando discussões e desgastando a relação. Na verdade, são vários os sintomas que podem atrapalhar um casal nos casos de depressão. Muitas vezes o cônjuge se vê tomado pela impaciência diante de alguém que está apático, irritado e sempre triste, alguém que tende a valorizar demais as casualidades negativas e que pode até mesmo se tornar uma pessoa controladora, com medo de que o familiar se afasta.
Perda de libido e vida sexual
Se por um lado a depressão pode levar ao desinteresse pelo sexo, de outro muitos pacientes temem que os próprios medicamentos utilizados no tratamento tenham impactos negativos sobre a libido. Somam-se a essa preocupação as questões estéticas, como as variações bruscas de peso, que muitas vezes também estão relacionadas à depressão, o que também pode ter impacto direto sobre a autoestima e a vida sexual do casal.

As pessoas chegam ao consultório com uma ideia distorcida sobre os efeitos colaterais dos antidepressivos, que atuam de forma diferente em cada um dos pacientes. Hoje, há medicações que já não exercem impacto significativo sobre o peso do paciente nem sobre o desejo sexual. Há outros fatores, físicos e psicológicos que podem interferir na libido, como alterações hormonais, algumas doenças e a qualidade da relação conjugal e da vida sexual no período anterior à depressão.

A evolução no entendimento da depressão e o conhecimento cada vez mais aprofundado dos fatores relacionados à doença têm possibilitado o desenvolvimento de tratamentos cada vez mais modernos, eficazes e seguros, como os antidepressivos de terceira geração que interferem bem menos na libido. Com ação dual, esses medicamentos conseguem equilibrar a disponibilidade de dois neurotransmissores importantes e diretamente relacionados aos quadros depressivos: a noradrenalina e a serotonina.

Sobre o autor:

5389ba9a481dbjoel-renno-junior-mentes-femininasJOEL RENNÓ JR é Ph.D em Ciências, professor colaborador médico do Departamento de Psiquiatria da FMUSP e diretor do Programa de Saúde Mental da Mulher do Instituto de Psiquiatria da USP (IPq-USP). Também coordena a Comissão de Estudos e Pesquisa da Saúde Mental da Mulher da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e é médico do Corpo Clínico do Hospital Israelita Albert Einstein em São Paulo.

Fonte: http://emais.estadao.com.br/blogs/joel-renno/como-evitar-que-a-depressao-desgaste-o-relacionamento-a-dois/

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DESTAQUES

9 Comentários

  1. Daniel Monteiro López 8 de junho de 2017 às 23:02 - Responder

    Muito esclarecedor!
    Agradeço essa grande ajuda.

  2. Lovanio Erniques 14 de junho de 2017 às 14:36 - Responder

    Preciso de ajuda. Minha esposa sofre de transtorno afetivo (algo que transita por personalidade borderline, não há diagnóstico clínico). Ela já fez terapia com psiquiatra – toma medicação – de forma desregrada -e sempre abandonou o tratamento quando a terapia chegava ao “fundo” de seus problemas, só vai ao psiquiatra pegar a receita mensalmente. O problema se manifestou mais gravemente depois do nascimento da primeira filha, há 16 anos, e se agravou demais depois do nascimento da segunda filha, há 10 anos. Eu sempre fui o alvo das agressões. Uma vida de tormentas. Cada ligação dela no telefone ou a cada chegada minha em casa, no fim do dia, pode ser uma surpresa horrível – é como uma panela de pressão que explode do nada e, na maioria das vezes, por motivo fútil – Agora que as meninas cresceram e começaram a demonstrar sua individualidades, passaram a ser também alvo dos ataques. A menor é a que mais está sofrendo pois, tenho certeza, já percebeu a instabilidade da mãe e os riscos que ela corre (a mãe) e também ela (a filha) pois assiste brigas e acusações e sabe que o casamento dos pais: base de sua sustentação emocional e material na infância que foi está muito comprometida. Resultado: na filha menor: pânico. Está fazendo terapia. A filha mais velha também.Eu faço terapia de apoio desde antes disso tudo, para tentar conviver (mas a terapeuta deixa a desejar, porém é o que o convenio e a situação financeira me permitem ter). Com alguns meses de tratamento, as psicólogas das filhas (não é terapia familiar, mas individual) sugeriram a minha mulher o inicio de uma terapia. Ela está fazendo, mas não assume para o profissional seu problema. Vai às consultas e volta de lá dizendo que o terapeuta está orientando ela a se livrar de mim e do casamento, como se eu fosse o grande responsável pelas desgraças da vida dela. Isso só reforça sua conduta em casa. Eu , para proteger as filhas , não alimento mais discussões. Sigo sendo um pai que atende a tudo dentro de casa na missão de manter um equilíbrio, até que a mais nova amadureça e possa suportar a possibilidade de separação, porque não é fácil: em resumo, minha mulher sabe da minha vulnerabilidade perante as filhas. Sabe que me mantém preso por elas e que eu raramente vou revidar as agressões. Então explode como uma “mulher-bomba” me acusando de tudo que vai mal na vida dela, da falta de dinheiro, do emprego que ela tem que ter para se sustentar,já que eu não ganho suficiente para nós todos, de que ela , além de tudo, não é amada por mim e que eu sou a infelicidade que ela atura pelas filhas. Somos, eu , pai, e filhas reféns de uma “terrorista emocional” que não aceita se tratar adequadamente. Preciso falar sobre isso com a terapeuta dela – expor a minha versão da história – mas a clinica não me dá abertura por questões de ética profissional e, talvez, por não acreditar em mim e achar que isso, na verdade, é somente uma briga de casal, uma roupa suja que deve ser lavada em casa. Alguém pode me sugerir algo?

    • Equipe Abrata 15 de junho de 2017 às 11:17 - Responder

      Prezado Lovanio.

      O transtorno bipolar traz sofrimento para o doente e, por via de consequência, para seus familiares, ou seja, todos são afetados de uma
      maneira ou de outra.
      Várias são as pessoas com transtorno bipolar que ignoram que o tratamento medicamento combinado com psicoterapia faz com o doente tenha
      uma vida satisfatória e produtiva pois, salvo em casos excepcionais, ele não é considerado incapaz.
      A estabilização dos sintomas tem que ser a meta a ser atingida pelos portadores. Para tanto, há que se ter disciplina de vida: tomar a
      medicação de acordo com a prescrição do psiquiatra, dormir por, pelo menos, 8 horas, não ingerir álcool ou drogas, fazer exercícios físicos,
      alimentar-se adequadamente, etc.
      Do lado dos familiares, é importante que mantenham um ambiente familiar sem muito estresse para que este não se converta em gatilho disparador
      dos episódios.
      Você estão fazendo terapia, ótimo, os cuidadores têm que se cuidar.
      Lembre-se, Lovanio, que sua esposa não está seguindo o tratamento à risca. Dessa forma, os sintomas não estão sob controle.
      A mulher-bomba tem transtorno bipolar, que é uma doença complexa. Ela não age assim porque deseja assim proceder, ela está sofrendo muito,
      saiba disto.
      Sugerimos que você insista em conversar com a terapeuta de sua mulher para demonstrar a ela a importância da adesão ao tratamento psiquiátrico
      para o controle dos sintomas do transtorno bipolar. E se a pessoa não conhecer o que é a bipolaridade, pense na possibilidade de substituí-la.
      Leia o livro GUIA PARA CUIDADORES DE PESSOA COM TRANSTORNO BIPOLAR, que você pode baixar gratuitamente no site:
      https://www.abrata.org.br/new/folder.aspx

      Confira abaixo as 10 dicas elencadas e publicadas pela ABRATA para você saber lidar com o TB:

      Apoie o paciente em momentos difíceis. Mantenha os medicamentos na dose certa e no horário prescrito;
      Seja firme e tenha paciência. Isso porque o relacionamento com o paciente em euforia pode ser desgastante;
      Detecte com o paciente os primeiros sinais de uma recaída; se ele considerar como intromissão, afirme que seu papel é auxiliá-lo;
      Fale com o médico em caso de suspeita de ideias de suicídio e desesperança;
      Estabeleça regras de proteção durante fases de normalidade do humor, como retenção de cheques e cartões de crédito em fase de mania;
      Auxilie a manter boa higiene de sono e programe atividades antecipadamente.
      Não exija demais do paciente e não o superproteja; auxilie-o a fazer algumas atividades, quando necessário;
      Evite demonstrar sinais de preconceito que favoreçam ao abandono do tratamento;
      Aproveite períodos de equilíbrio para diferenciar depressão e euforia de sentimentos normais de tristeza e alegria;
      Participe de terapias familiares em grupo, conjugal e orientações psicoeducacionais.

      Um abraço.
      Equipe ABRATA.

  3. Priscila Pereira 13 de julho de 2017 às 19:09 - Responder

    Olá, eu fui diagnosticada com TB aos 28 anos, fui mãe nova aos 14 anos e tive depressão pós parto. É muito complicado conviver com os sintomas do Transtorno Bipolar. Estou tendo dificuldades pra trabalhar, pois tenho vergonha de me apresentar às pessoas. Já falei com meu médico mas, além dos que eu já tomo, receitou-me um remédio que me dá mal estar, fico pior. Me sinto culpada o tempo todo, preciso sustentar minhas filhas e é horrível não se sentir normal pra desenvolver coisas simples. Tenho estado muito triste e fica difícil até dar um simples sorriso. Quero ser e estar melhor, o quê fazer?

    • Equipe Abrata 16 de julho de 2017 às 06:19 - Responder

      Prezada Priscila

      A medicação prescrita pelo psiquiatra pode ser adequada às suas necessidades. Ele poderá diminuir ou substituir o medicamento.
      Sugerimos que procure um psicoterapeuta.
      A psicoterapia é um termo geral usado para descrever o processo de tratamento de distúrbios psicológicos e sofrimento mental pelo
      uso de técnicas psicológicas através da fala. Durante este processo, um psicoterapeuta treinado ajuda o paciente a resolver problemas
      específicos ou gerais, tais como uma doença mental em particular ou uma fonte de estresse na vida.

      Um abraço
      Equipe ABRATA

  4. Juliana Barbosa De Oliveira 7 de janeiro de 2018 às 23:06 - Responder

    Boa Noite! Tenho 32 anos e tenho um enorme desejo de ter uma família,ter um filho, meu ex companheiro já desistiu se de mim tantas vezes, que acho que ele deve ter razão, mas ninguém presta atenção em mim. Só queria alguém que me pudesse ir médicos, para tentar ficar bem e ser mãe e fazer feliz meu marido. Mas a cada dia me afundo mais. Este último termino. Peguei um trem e fui para nossa antiga faculdade, chorei tanto que nem sabia onde estava. Peço ajuda de como posso dar esse passo.

    • Equipe Abrata 17 de janeiro de 2018 às 10:56 - Responder

      Olá Juliana.

      A melhor maneira para que você leve uma vida normal é procurando ajuda de um médico psiquiatra.
      Talvez você esteja deprimida e precise de orientação médica para um tratamento eficaz.
      Procure ajuda, está bem?

      Um abraço
      Equipe ABRATA

  5. rosana 14 de novembro de 2018 às 21:52 - Responder

    No meu caso, independente de ter pactuado o juramento “na alegria e na tristeza, na saúde e na doença”, meu ex marido nunca se habilitou a contribuir no meu tratamento no sentido de me auxiliar ou apoiar o tratamento, sequer perguntar alguma vez se eu estava melhor, pior, mais ou menos ou seja lá o que fosse.Este cenário me fez ver que eu estaria diante de um duplo sofrimento: a depressão , que hoje cronificou e está severa com episódios mais longos e profundos e a infalível separação conjugal.
    Como agravante, o ex marido dizia que havia se casado com uma mulher forte em dadas discussões e quando chegava em casa e me via na cama, simplesmente,
    fechava a porta do quarto como se assim o problema estivesse isolado ou na melhor das hipóteses poderia justificar que o barulho da televisão que ia assistir não me incomodasse. Dissimuladamente, diante dos fregueses, parentes e amigos,dizia a todos que eu tinha depressão e coitada de mim que inteligente e generosa estaria sofrendo muito com ares de solidariedade.Hoje, depois de 20 anos de depressão, entendo que para todo tratamento de transtorno afetivo, deveria constar no protocolo a intimação da família para conscientização sobre as demandas que o tratamento irá produzir e as respectivas responsabilidades, inclusive sobre como as negligências que afetam diretamente no tratamento e afetivamente no portador.Este meu comentário, traduz um desabafo, mas acima de tudo uma sugestão.

    • blogabrata 9 de fevereiro de 2019 às 12:27 - Responder

      Olá Rosana,
      Agradecemos muito o seu depoimento e a sugestão feita. É fundamental que a família e os amigos apoiem a pessoa
      que se encontra em tratamento para depressão ou transtorno bipolar.
      Um grande abraço.
      EQUIPE ABRATA

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